24 março, 2010

Quando me procurares, talvez já não me encontres. Não pedirei a ninguém, não por orgulho mas por ter que ser assim. Com as minhas próprias mãos abro o pipo da bóia de salvação que me segura a lado nenhum. Oiço o lento esvaziar demorado. Abandonam-me as falhas, escapam-se as faltas, larga-me o ar que um dia entrou e que nunca me pertenceu. Quando entrares e um sopro frio te beijar de raspão, não tenhas medo, sou eu que num último suspiro me despeço de ti.

15 março, 2010

sobre a mesa-de-cabeceira: Os Cus de Judas - A. Lobo Antunes

Admitindo a minha ignorância, confesso que desconhecia o tema do livro quando o comprei. Compra esta, apenas motivada pelo fascínio que o título me oferecia sempre que o via numa livraria e me atraía como um íman. Os Cus de Judas. Estava longe de imaginar que fossem os locais por onde a guerra andou em tempos de colonialismo, contudo em nada me fizeram arrepender de os ter tido "sobre a mesa-de-cabeceira".
Também nunca tinha lido Lobo Antunes. Minto. Por vezes leio as crónicas que escreve para a Visão.
Aparentemente um caos, é uma prosa altamente poética, repleta de flashes de Polaroid que nos encandeiam e despertam as mais variadas emoções.

"gostava (...) de lhe oferece o meu retrato em coração de esmalte para você usar quando for gorda, porque será gorda um dia, descanse, todos nós seremos gordos, gordos, gordos como gatos capados à espera da morte nas matinées de Odéon"
"ouvir nascer a própria barba nos serões vazios"
"iniciei a dolorosa aprendizagem da agonia"
"branco sopinha de massa cujo esforço para falar o torcia de caretas de defecação (...) as bochechas possuiam qualquer coisa de anal e o nariz se aparentava a inchaço incómodo de hemorróida."
"puxando um cobertor de terra por sobre o sangue dos cadáveres"
"galinhas, pássaros imperfeitos reduzidos a um destino de churrasco"
"dentro do útero da minha mulher uma criança prestes a nascer socava às cegas as grades de carne da sua prisão"
"escute-me como eu escutava o rápido latir aflito do meu sangue nas têmporas"
"Perguntei [ao capitão] onde é que você vai? (...) - Pendurar os tomates na arrecadação, doutor, se quiser dê-me também os seus que já não precisamos dos gajos para continuar aqui."
"Não sucede o mesmo consigo? Nunca teve vontade de se vomitar a si própria?"
"os lábios rodeavam-se de pregas concêntricas de ânus"
"petromax (...) contra o qual os insectos se desfazem num ruidozinho quitinoso de torresmos"

"os soldados julgavam-me capaz de os acompanhar e de lutar por eles, de me unir ao seu ingénuo ódio contra os senhores de Lisboa que disparavam sobre nós balas envenenadas dos seus discurso patrióticos"


08 março, 2010

Sobre o ventre com languidez, esperas a espuma revolta em areia. Joga contigo um "toca-e-foge" que numa cadência, ora meiga te acaricia demorada, ora feroz te perfura numa raiva desmedida. Sem queixume e com a serenidade que sempre te conheci esperas um novo jogo, em vão.
Não te reconheces onde estás, não te reconheces onde possas ir. Sabes que não pertences aqui. Deixa que chegue aquele último dia em que tu, tal um dente-de-leão, te disperses na boleia do vento e encontres finalmente o teu lugar.

05 março, 2010

Porque é que as lojas dos chineses têm todas o mesmo cheiro?!

Por vezes num passeio à "beira-lojas" plantado dou comigo a dizer "cheira a loja dos chineses" e quando olho, tcharaaamm!!, lá está ela, uma loja dos chineses. Incrivelmente perturbante!
Aliás estou em crer que, exista inclusivamente um gene que codifique para uma proteína associada ao receptor do odor a "loja dos chineses"...